Curiosidade não mata

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Quantas vezes você precisou de algum serviço ou produto e não encontrou? Por exemplo: onde comprar plantas carnívoras, roupas blindadas, panetones decorados ou camisa-de-força? Ou então onde alugar um boneco de ventríloquo? E encomendar um bolo de aniversário com uma loira dentro? Parecem coisas absurdas que não existem? Pois não são. O jornalista e escritor, Marcelo Duarte revela estes e outros lugares difíceis de serem descobertos na cidade no livro “1075 endereços curiosos de São Paulo”.
Marcelo Duarte nasceu em Pinheiros, em 1964, e atualmente mora em Perdizes. Quando criança tinha o hábito de perguntar tudo e o porquê das coisas. Não foi à toa que se tornou jornalista. Trabalhou 14 anos na Editora Abril. A experiência abriu caminho para realizar o sonho de ser escritor.
O primeiro livro, Guia dos Curiosos, lançado em 1995, veio do antigo hobby, que mantém até hoje, de colecionar curiosidades e andar pelas ruas em busca de novidades. O sucesso foi tão grande que o livro deu origem à série com seis volumes editados pela Panda Books, sua própria editora, que já conta com 150 títulos.
Em sete anos, Marcelo Duarte vem revelando novos autores e best sellers como “O doce veneno do escorpião”, da ex-garota de programa Bruna Surfistinha. Além da coleção O Guia dos Curiosos, Marcelo possui mais 14 livros publicados, entre eles “A origem de datas e festas”. Em dezembro, ele lança a série “O dia em que me tornei…”, que trata de futebol e revela a história de como ele, Selton Mello, Mauro Betting e Waldir Lemos escolheram seus times do coração.
Quer saber mais? Então confira esta entrevista e conheça outras curiosidades sobre Marcelo Duarte, um obsecado por novidades.

Você sempre foi uma pessoa curiosa?
Existe uma diferença entre ser curioso e xereta. Quando criança eu fazia a linha curiosa. Perguntava o porquê das coisas e queria saber de tudo. Meu irmão fazia a linha xereta. Aquele que mexe em tudo, abre rádio… Isso eu nunca fiz, sempre fui perguntador. Meus pais diziam que eu faria jornalismo. Quando cheguei à fase de prestar vestibular e escolher a carreira eu queria escrever e ser escritor. O mais próximo desta profissão era o jornalismo.

Como surgiu o Guia dos Curiosos?
Eu tinha o sonho ser escritor mas precisava de uma idéia para escrever o livro. Trabalhando na Veja São Paulo eu usava muitas informações curiosas para rechear as minhas reportagens. Uma vez fiz uma matéria sobre atendimento bancário. Fui ao Banespa do Viaduto do Chá, a agência mais cheia da cidade. Isso no tempo em que não havia internet e serviço de phone bank. Peguei uma fila única com cerca de 70 metros. Contei no relógio quanto tempo levaria para ser atendido. Demorei duas horas e dez minutos. Voltei para a redação, fiz uma pesquisa e descobri que uma lesma para andar 70 metros leva uma hora e meia. Pronto, legal, a lesma chega 40 minutos antes. As pessoas adoraram. A partir daí toda matéria tinha um fato curioso, uma citação engraçadinha para chamar a atenção. Isso me fez começar a colecionar curiosidades. Imaginava que seria só para o meu uso. Virei um consultor de curiosidades. Coincidentemente viajei para a casa de uma tia do interior que tinha uma prateleira repleta daqueles livros antigos encadernados chamados “Almaque Curioso”, era uma coleção com nove volumes dos anos 60. Era super antiga e defasada, até questionava se o homem chegaria à Lua. Foi então que acendeu uma faísca e resolvi fazer uma coleção moderna e entreguei o projeto a uma editora. Era um projetinho com duas páginas de sulfite. Em um ano eu conclui a primeira ediçao do livro. Foi gostoso porque eu tive que voltar a estudar e pesquisar. Parecia que estava fazendo cursinho. (risos)

E foi um sucesso que originou a série…
O Guia dos Curiosos veio após 11 anos de profissão, em 1995. Atualmente ele está perto dos 200 mil exemplares vendidos. Foram três edições e mais de 20 impressões. A série é composta de seis temas: esportes, invenções, Brasil, sexo – com Jairo Bouer, o único com co-autoria -, língua portuguesa e jogos olímpicos. O guia de endereços curiosos foi iniciado em 1992 . Fui guardando o material até publicá-lo em 1999.

Por que a demora?
Eu trabalhava na Vejinha quando saiu o filme “Instinto Selvagem”. Em uma reunião de pauta, nosso editor citou a cena em que a personagem da Sharon Stone mata o amante com um furador de gelo. Será que encontra-se furador de gelo em São Paulo? Essa era a pauta. Eu e um outro repórter saímos atrás do furador de gelo. Fomos na rua Paula Souza. Não achamos. O Brasil não tem tradição de comprar bloco de gelo para precisar de um furador. Mas achamos coisas sensacionais como onde consertar meia de nylon desfiada, onde comprar anão para jardim. Mudamos de pauta. Ficamos um mês andando por São Paulo até listar 130 coisas legais na cidade. Foi uma matéria de capa: “Onde encontrar o que é difícil”. Foi o maior sucesso. Pensei que no ano seguinte fossem repetir o tema da matéria e eu resolvi ir me preparando: ah, tudo que encontrar a partir de agora vou guardar. Abri uma pasta para guardar tudo que encontrava. Lia classificado de jornal e via um cara vendendo lhama recortava e guardava. Eu saia para comer fora e via alguma coisa diferente anotava o endereço no guardanapo e colocava na pasta. Fui guardando e no ano seguinte ninguém lembrou daquele especial, no outro ano eu saí da Vejinha. E aquilo se tornou um hábito. Em 1999 a pastava cheia de coisa. Ofereci para a Companhia das Letras, mas não era o perfil deles. Resolvi abrir a minha editora para lançar esse livro. Eu dividia uma casa com outro escritório na rua Purpurina.

Quando surgiu o site…
Eu entrei naquela onda que todo mundo tem um site para divulgar o seu trabalho. Só que não queria cair a besteira de colocar todo conteúdo do livro nos sites. Eu vendo os livros. Criei um conteúdo suplementar e comecei a trabalhar com as curiosidades do dia: hoje é dia da democracia, então vamos levantar curiosidades sobre a democracia.

Hoje você tem uma equipe para te ajudar nessa busca por curiosidades?
O Guia dos Curiosos eu faço sozinho. Tenho algumas pessoas me ajudando para fazerem as checagens da informações. Também conto com amigos consultores. Se vou fazer um livro e um capítulo trata de futebol procuro alguém que conheça bem o assunto para dar uma lida final. Tem um capítulo sobre tupi-guarani, então vou procurar um professor para fazer a revisão. O livro nunca sai sem que algum especialista avalie. Envio capítulos específicos para cada pessoas. Já o livro de Endereços Curiosos de São Paulo aí sim, tem muita gente colaborando porque precisa ir aos lugares fazer o trabalho de reportagem. Um livro com mil endereços, não dá para uma pessoa só fazer, quando terminar a apuração já está defasado. Tem o trabalho de telefonar para cada lugar e ver se os telefone estão batendo, se os lugares continuam nos mesmos endereços.

E o livro de endereços cresceu!
Esse ano para não fazer o o Endereços Curiosos de São Paulo 3 e ficar uma coisa muito cara para o leitor eu juntei os três volumes em um livro só. A idéia era que o livro chamasse 1000 Endereços Curiosos de São Paulo. Só que isso é uma coisa meio compulsiva para mim. (risos) Conforme ia achando endereços queria incluí-lo ou pensava em deixar para o próximo. Mas deixar para o próximo ia demorar muito. Foi, foi, foi e chegou aos 1075 endereços. Me perguntam por que 1075. Foi o número que eu consegui parar. (risos) Agora estou criando um blog para colocar os outros. O livro foi lançado há dois meses e eu já tenho pelo menos 15 endereços muito legais.

Qual foi a última descoberta?
Foi um veterinário especializado em desvendar crimes contra animais. Ele fez medicina veterinária legal. Ele faz toda autópsia para descobrir a forma como o animal foi morto. Achei maravilhoso.

Como você descobre esses endereços?
Eu ando muito em São Paulo. Hoje mesmo ei fui para o Pari procurar umas coisas. Eu também recebo revistas e vou atrás das sugestões. Quando chega o Guia da Vila eu leio da primeira linha até o último classificado para tentar descobrir alguma coisa. E vou aos lugares. Soda Italiana, por exemplo. Fui naquela loja Cookies, mas estaria disponível só na outra semana. Esse tipo de novidade eu preciso experimentar. Outro bairro que é 100% certeza encontrar alguma novidade é a Liberdade. A cada dois meses eu tenho que ir até lá. É sagrado. Centro da cidade também. Às vezes faixa de rua ou carro de propaganda. Estou sempre com um bloquinho e caneta no bolso.

Aqui em Perdizes tem algum endereço novo e curioso?
Mudei há dois meses para o bairro. Já dei umas caminhadas à pé e descobri as docerias, como A Quitutera da Alfonso Bovero. (risos) Na padaria Euroville descobri o pão de forma colorido. Também descobri um senhor italiano, de 72 anos, que faz clonagem de sapatos. De repente você tem um sapato que gosta muito mas gastou e a loja de fábrica não vai repetir a coleção, então ele faz um igualzinho. É uma portinha que fica na rua Wanderlei.

Endereços Curiosos já existe em outras cidades?
É uma coleção com 13 volumes. Tem Rio de Janeiro, Belo Horizonte, Salvador, Nova York, São Francisco, Paris, Amsterdã, Barcelona… É um conceito que deu certo. É um guia para quem viaja muito e quer novidades.

Curiosidade é um assunto inesgotável?
A graça do negócio é misturar uma informação útil com outra totalmente inútil. Fica uma coisa muito bem-humora com textos curtinhos. Tem o segredo de costurar as curiosidades, juntar uma com outra que não tem nada a ver e formar uma terceira curiosidade engraçada. Ou então algo totalmente novo. Aqueles sabonetes por quilo era uma novidade no primeiro livro. Hoje em dia todos os shoppings têm. Em uma próxima edição eu tiro essa informação porque deixou de ser curioso. Outro dia descobri um lugar que vende chocolate de leite de cabra. Isso eu não tinha visto antes. Quando eu chegar em um hipermercado e achar aí perde a graça. Tem esses critérios. Me perguntam porque não coloco lojas de roupas modelos grandes. Todo lugar tem. A loja Rechonchée de lingeries para gordinhas, na Vila, foi uma novidade muito legal.

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