Ademir da Guia: uma|carreira vitoriosa

0
2512

Ademir da Guia, o Divino, está
comemorando 50 anos de futebol. Carioca, começou a jogar futebol
profissionalmente no Bangu e em 1968 chegou ao Palmeiras, onde jogou
901 partidas (é o jogador que mais disputou partidas pelo clube), fez
153 gols e conduziu a bola de maneira elegante dentro dos gramados, que
lhe rendeu o apelido de Divino. Nesta entrevista, que aconteceu nos
jardins do Palmeiras, o mais famoso camisa 10 do clube falou de
futebol, seleção brasileira, torcidas, política e de suas quase quatro
décadas como morador da região.

Você é filho de um grande
jogador de futebol, Domingos da Guia. Ele influenciou na sua decisão em
se tornar um jogador de futebol?

Na verdade foi uma coisa
natural. Ele viu que eu levava jeito para jogar e me ajudou no início
de carreira. Ele era técnico no Bangu e me levou para treinar nas
categorias de base, onde comecei.

Seu pai era zagueiro. E você jogou no meio de campo para frente.
Eu
e ele jogamos em posições diferentes. Ele foi um zagueiro clássico, não
dava chutão. Eu herdei muito dessa maneira de jogar. Mas preferi jogar
mais na frente. Queria fazer gols. E assinei meu primeiro contrato como
profissional do Bangu aos 18 anos.

Naquele tempo, o salário era bom como hoje?
Não
era muita coisa, mas dava para ter um dinheirinho. Era um começo e era
um orgulho jogar e ganhar para isso. Não era o valor e sim você ter
chegado a uma equipe.

Você estudava e jogava futebol?
Quando
comecei no profissional, eu estava no terceiro ano e viajei muito com o
time do Bangu. Eu, com 18 anos, em 1960, disputei um torneio em Nova
York (EUA) e ficamos lá um mês. Depois, fomos para a Europa e vários
países – Portugal, Espanha e até a Suécia.

Como foi a sua transferência para o Palmeiras?
Fizemos
dois amistosos em Campinas. Jogamos contra a Ponte Preta e o Guarani. O
técnico do Guarani era o Armando Renganeschi e ele indicou meu nome
para o Guarani comprar, mas o Bangu não se interessou pela proposta e
resolveu não vender meu passe. E depois o Reganeschi veio para o
Palmeiras, indicou meu nome e aí o Bangu resolveu me vender. Cheguei em
agosto de 1961 e joguei até 1977. Parei aos 35 anos porque tive um
problema de respiração.

Neste tempo de Palmeiras, você teve proposta para sair?
Naquela
época, os jogadores que serviram a seleção eram contratados. Alguns
deles aqui do Palmeiras, como Chinezinho, que jogou na seleção, foi
para a Europa. Quem saía ia basicamente para Itália e Espanha.

A dupla Dudu-Ademir da Guia foi uma marca do time do Palmeiras.
Foram 12 anos. Eu podia estar em qualquer espaço do campo, que sabia o que ele iria fazer com a bola.

Antigamente, era raro um jogador de um grande clube se transferir para o outro.
Quem
jogava no Palmeiras ou no Corinthians nunca seria contratado pelo
adversário. Isso não acontecia. Entre nós, jogadores, existia amizade e
respeito profissional. Eu tinha amizade com Rivelino, Tião, Basílio
(jogadores do Corinthians). Quando o Baldochi saiu do Palmeiras e foi
para o Corinthians, ele jogou um tempo. Mas quando mudou a diretoria do
Corinthians, ele não foi mais aproveitado. Depois veio o Müller, que
jogou no Palmeiras, Corinthians, São Paulo, isso ficou normal, como é
atualmente.

Quem negociava seus contratos e renovação? Era você mesmo ou tinha procurador?
Era
eu mesmo. Hoje, o atleta tem um profissional que negocia o contrato
dele. Nós não tínhamos isso. Eu negociava e acertava tudo com o
presidente do Palmeiras diretamente.

Você ficou rico com o futebol?
Não,
não cheguei a tanto. Quem ficou rico é quem foi para a Europa. O
Mazola, por exemplo, foi para a Itália e nunca mais voltou. Eu acho que
com os valores de antigamente aqui no Brasil não dava para enriquecer.
Ficou rico quem saiu para fora, como o Rivelino, que foi jogar na
Arábia Saudita. Quem jogava por aqui não. A carreira de um jogador dura
uns quinze anos e é desgastante. Se dos 20 aos 35 anos você conseguir
jogar bem, pode ficar bem.

Os salários de alguns jogadores dos grandes clubes são reais ou você acha que eles estão ganhando muito?
São
poucos que têm um grande salário. Agora, se o jogador recebe um bom
salário, fez por merecer esse salário. Quando acontece uma diferença
grande entre os jogadores de um mesmo clube, eu entendo que, se todo
mundo ganha 40, isso não é bom porque ninguém vai ganhar mais. Mas
quando chega alguém ganhando 400, a chance de aumentar os salários dos
que ganham menos é maior. Se o time faz um bom campeonato, todo o time
tem condição de pedir um aumento. Eu acho isso bom. Acho ruim se vem
alguém ganhando menos. A chance é pequena de elevar o salário dos
demais.

A várzea contribuiu e ainda contribui para o aparecimento de novos jogadores?
A grande maioria veio da várzea. Mas eu mesmo não joguei muito em várzea lá no Rio.

Qual foi o técnico que você destacaria na sua carreira?
Tive
muitos técnicos bons em minha carreira. Osvaldo Brandão teve um sucesso
muito grande aqui no Palmeiras e se identificou com o clube. O Filpo
Nuñes teve uma fase muito boa. Trabalhei com Mário Travalini, Rubens
Minelli, Freitas Solich, Geninho. Inclusive foi o Geninho quem me
lançou em 1963.

Qual é o papel de um técnico com jogadores mais diferenciados como você?
O
papel dele é colocar os onze melhores jogadores em campo. Um exemplo
que vivi aqui no Palmeiras. O Dudu veio da Ferroviária de Araraquara,
onde ele jogava de meia-direita. Eu era meia-esquerda. Quando o Dudu
chegou no Palmeiras, ele viu que de meia ele não teria muitas condições
de jogar. O técnico da época (Osvaldo Brandão) percebeu que ele seria
melhor aproveitado na marcação e deu certo.

E a parte tática?
Os próprios jogadores, dentro de campo, podem fazer. Cada um sabe o que tem de ser feito.

Quais jogadores que você mais admirava?
Leivinha, Rivelino, Pelé, Coutinho, Falcão (do Internacional).

Como foi sua passagem pela Seleção Brasileira?
Não
tive muitas oportunidades. Joguei em 1965 numa excursão pela Europa e
em 1974 na Copa da Alemanha (disputa do 3º lugar contra a Holanda, que
venceu a partida). Joguei muito pouco por opção do Zagallo que era o
técnico.

Você gosta da seleção brasileira do Dunga?
Ele
tem um tempo ainda até a Copa. Os jogos serão difíceis. A missão dele
de classificar o Brasil foi cumprida. Agora é que será o grande desafio.

O que você fez depois de deixar de jogar?
Eu
parei de jogar em 1977. Trabalhei como técnico nas categorias infantis
aqui no Palmeiras e em outras escolinhas de futebol. Trabalhei também
no Banco do Brasil.

Seu filho, Ademir da Guia Junior, também joga.
Ele está jogando aqui. Neste ano passou por uma cirurgia no joelho e está voltando agora.

Você está no bairro há 40 anos. Do que você gosta aqui?
Vim
por causa do Palmeiras, já que a gente treinava aqui no Parque
Antártica. Me acostumei e gosto daqui. Vou muito à pizzaria Piarello e
ao Macedo, onde almoço com frequência. Tenho muitos amigos na Rua
Cardoso de Almeida. Aqui é o bairro ideal, tem tudo de que eu preciso.

Como foi sua ida para a política?
Fui convidado pelo Aldo Rebelo, que também é palmeirense. Fui eleito vereador pelo Partido Comunista do Brasil.

Que balanço você faz de seus quatro anos como vereador?
Foi bom. Aprendi muitas coisas. Agora estou no PPS e devo sair em 2010 como candidato a deputado estadual.

Você ficou frustrado por não ter sido reeleito vereador?
Não.
No esporte e na política você aprende a ganhar e a perder. Foi uma
eleição difícil, tive 17 mil votos. Tive alguns erros. Apesar das
limitações, sou realista e sabia que a eleição seria difícil. Ganhar ou
perder é uma consequência. Na próxima eleição, vou trabalhar para
ganhar, é claro.

Quais são suas bandeiras?
Violência,
desemprego e outras coisas. Sempre estarei ligado ao esporte. Mas tenho
uma visão global. Temos tantos outros problemas e, se eu puder ajudar,
será importante.

Terminou o Brasileirão 2009. O que faltou ao Palmeiras?
Ele
merecia ser campeão mas deixou os outros chegar. O problema que o
Palmeiras teve foi uma queda no rendimento da equipe. As saídas do
Pierre e do Cleiton Xavier prejudicaram o time. Do jogo do Náutico em
diante, o time jogou mal em todos os setores. Faltou consistência à
equipe. Faltaram reservas à altura para o técnico. O time todo sofreu
muito e todos os jogos foram difíceis.

Você gosta do estilo do Murici?
Gosto
de todos os técnicos. Técnico bom é aquele que escolhe os onze melhores
e vence as partidas. Não gosto daquele que recua o time.

Você se relacionava bem com a imprensa?
Jogador
e técnico precisam entender que, quando o time ganha, torcida e
imprensa sempre falam bem. Sempre procurei na minha vida avaliar as
críticas e melhorar. Eu acho que a crítica ajuda você a melhorar. Nunca
me senti perseguido ou algo assim.

Por que as torcidas uniformizadas são tão violentas?
A
gente não sabe a razão. Quando eu jogava, as torcidas chegavam juntas
ao estádio. Hoje, os torcedores brigam antes dos jogos, no metrô, pelas
ruas… É uma violência que não é comum…

E o que fazer?
Noto
que nas proximidades dos estádios tem muitas barracas vendendo cerveja
e cachaça. O torcedor já chega ao estádio bêbado. Na minha época não
era assim. Com os novos estádios, espero que melhore.

Em que país, além do Brasil, você aposta na próxima Copa do Mundo?
Acredito no Brasil e nas seleções mais tradicionais, França, Espanha.

Você ainda bate uma bolinha?
Sim, jogo no time dos masters aqui do Palmeiras e jogo em amistosos aqui na cidade e pelo interior.

O que significou o futebol para você?
Significou tudo para mim.

SEM COMENTÁRIOS

DEIXE UMA RESPOSTA