Mais um grupo de samba? Não, senhor. Esse é “o” grupo de samba. Ele é feito só por mulheres: são cinco percussionistas, duas instrumentistas e uma vocalista. Oito mulheres tocando, cantando e fazendo samba num país onde reinam algumas mulheres e muitos homens e grupos. Elas reverenciam os grandes nomes do ritmo nacional, como Ary Barroso, Jorge Pontual, Adilson Bispo, Benito Di Paula, Paulo César Pinheiro, além de cantarem as composições próprias.
Juntas desde 2003, elas já têm um currículo invejável: abriram shows de Martinália, Leci Brandão e Marcelo D2. No começo deste ano, no Projeto Prata da Casa, lotaram o SESC Pompéia deixando mais de 300 pessoas para fora. Em fevereiro, no carnaval, partiram para uma série de shows em Portugal (oito) e Londres (um). Em Cascais e Braga se apresentaram nos programas de maior audiência da tevê portuguesa e receberam muitos elogios da crítica. O destaque do show londrino foi a versão em samba de ‘Satisfaction’, dos Rolling Stones, que mereceu atenção da imprensa inglesa no jornal The Guardian.
Em 2004, lançaram o CD ‘Isso é Samba de Rainha’, com dez músicas inéditas de autoria delas. Agora que largaram suas profissões e se dedicam somente ao grupo, elas lançam o CD ‘Vivendo o Samba’, com shows de lançamento na choperia do SESC Pompéia, dia 30 e 31 de maio.
Com vocês, as meninas do Samba de Rainha: Aidée Cristina (41), surdo e coro; Carina Iglecias (28), percussão e coro; Érica Japa (34), rebolo; Gadi Pavezi (31), pandeiro; Naná Spogis (27), violão; Núbia Maciel (40), vocal; Sandra Gamon (34), tamborim, repinique e coro, e Thaís Musachi (21), cavaco e coro.
Instaladas num escritório em Perdizes, ali elas se encontram para ensaiar, conversar e saborear os novos rumos que o sucesso vem trazendo. Foi num estúdio de gravação que as encontramos, depois de uma noite tocando no Bar Brahma. Falamos com metade do grupo. Não é fácil falar com tanta mulher ao mesmo tempo, mas fica aqui um registro bacana. Com vocês, Samba de Rainha.
Há quanto tempo vocês estão juntas?
Núbia: Vai fazer cinco anos.
Como foi a idéia de juntar as meninas pra fazer um grupo?
Núbia: Na verdade foi a Pat, uma japonesa, que foi fundadora junto comigo e tocava cavaquinho, e já saiu. Ela me encontrou um dia na rua e me chamou pro sambinha que ela fazia em casa. Aí eu fui e era só uma brincadeira, quem chegava pegava um instrumento e tocava. Depois a mulherada acabou se empolgando, cada uma com um instrumento e foram ficando as que gostaram. Daí cantávamos em festinhas de aniversário, juntava a turma e íamos, e um dia uma menina nos chamou pra tocar num barzinho, aos sábados. Então começamos a pensar mais seriamente no assunto. Chamamos a Gadi, a Érica, que tocavam mais seriamente.
Profissionalizaram o grupo.
Núbia: É, ainda na brincadeira, mas mais sério, porque fomos convidadas pra cantar em outro bar, no Itaim, já com cachê. Aí ficou sério mesmo, começamos a ensaiar.
Como foi a experiência do primeiro disco?
Érica Japa: Foi um CD despretensioso, independente… Nós fizemos pra gente mesmo, a intenção não era fazer e acontecer. Era pra gente, pros amigos, pra ver o que ia acontecer. Vendemos umas seis mil cópias a maior parte deles em show. E essa quantidade também foi uma surpresa pra gente. Além disso, ele foi gravado em estúdio, com cada uma sozinha, tocando seu instrumento, com canal separado.
E o Vivendo Samba?
Érica Japa: Esse foi um trabalho diferente, como se a gente tivesse fazendo um show, mas todas tocando juntas no estúdio. A gente quis uma coisa nova: a energia que temos em cima do palco, a alegria. Os dois discos são bem diferentes.
E como ter lotação esgotada no SESC, com público lá fora ainda?
Gadi: Cada coisa que acontece pra gente com o Samba de Rainha é uma surpresa! Porque a gente faz porque gosta, esperamos fazer sucesso, que as pessoas vão nos prestigiar, mas da forma como acontece é surpreendente. A gente já tinha feito show lá, não estava vazio mas não estava lotado, mas esse último show… A gente ia recebendo as notícias em cima do palco.
Naná: A gente achou que as pessoas tinham errado o dia pra ver a Martinália… porque nosso show era na terça e o dela na sexta.
Os grandes do samba já viram vocês?
Gadi: Nós mesmas já fomos atrás, entregamos CDs.
Naná: No primeiro CD a gente fez uma música homenageando as grandes rainhas do samba na nossa opinião e entregamos CD pra boa parte delas.
Núbia: A Leci Brandão já viu; a Beth Carvalho nós falamos com ela, mostramos uma música pra ela; os caras do Fundo de Quintal, a Vó Maria (esposa do Donga), Dona Ivone Lara.
Por que Samba de Rainha, embora pareça óbvio?
Núbia: Primeiro porque a gente cantava em homenagem às rainhas mesmo, muito repertório feminino, com Clara Nunes, Beth Carvalho, Dona Ivone, queríamos prestar uma homenagem mesmo. É uma exaltação.
Neste momento o que está sendo legal pra vocês?
Gadi: Estamos apostando tudo nesse CD, é uma paixão.A gente quer que as pessoas nos conheçam, quer ir pra televisão, fazer grandes shows, ser mais reconhecido, ganhar dinheiro, afinal a gente vive disso. Todo mundo abriu mão de tudo pra se dedicar só música.
Núbia: É dedicação total. Como diz o nome do CD, Vivendo Samba, hoje a gente vive disso e como qualquer profissional a gente acredita e estamos lutando pra entrar na mídia.
Nana: O gostoso é que o Samba de Rainha aconteceu, não foi planejado e continua acontecendo, tanto que a gente se surpreende a todo instante.
E as discussões?
Gadi: Discussões existem e achamos que sempre irão existir, o que a gente vai aprendendo é ter mais tolerância uma com a outra… Decidimos em conjunto nossos arranjos, repertório, toda e qualquer coisa relacio nada à banda. Há sempre uma votação e sempre chegamos a um consenso.
Dá certo juntar oito mulheres?
Gadi: Bom, como todo mundo diz, oito mulheres juntas não é tão simples assim, principalmente quando as TPMs se encontram… No princípio da banda a coisa era mais complicada, mas hoje a gente já sabe o sintoma de cada uma, então fica um pouco mais fácil.
Vocês são amigas?
Gadi: Além de tocarmos juntas, temos a sorte de termos amigos dentro da banda, o que faz com que nossas relações sejam extra palco também. Como é um grupo grande, ora há mais afinidade de umas, ora de outras, tudo depende do momento de cada uma.