Com o livro ‘Traços e Cores’ que reúne parte do seu extenso e criativo trabalho de ilustrador, capista, escultor, jornalista, o artista plástico Elifas Andreato comemora 50 anos de carreira.
“Este livro são minhas lembranças”, escreve Elifas Andreato nas primeiras páginas do livro que foi lançado na noite de 10 de julho, na Livraria da Vila da Alameda Lorena. Antes da sessão de autógrafos, Elifas, reuniu no palco da livraria, a cartunista Laerte, o jornalista Fernando de Morais e o músico e parceiro de músicas, Toquinho para um bate-papo.
Laerte, Elifas Andreato, Fernando de Morais e Toquinho (Foto/Gerson Azevedo)
Na ocasião, Elifas contou à plateia como jornalista e artistas faziam para driblar a censura que a ditadura militar impôs ao país e com força maior nas redações. O mesmo acontecia nos shows e peças de teatro. Nada era encenado sem que a autorização expressa da censura. “Fui vítima da censura da ditadura”, lembrou Elifas. Na ocasião, Laerte cita o novo livro de Elifas como “uma forma de entender a nossa história atual”. E Fernando de Morais considera o livro de 416 páginas e mais de 600 ilustrações e fotografias, “como a jornada de arte do Elifas”.
Ícone das artes plásticas e artista com traço sensível, Elifas também é escultor e cenógrafo com trabalhos feitos para a televisão e para o teatro. O livro tem textos e é rico em referências, como os cartazes dos shows da cantora Elis Regina, Chico Buarque, Clara Nunes, Tom Zé e muitos outros mais.
Nascido em Rolândia (PR), Elifas conta que teve uma infância pobre e difícil. Em depoimento ao Museu da Pessoa, em novembro de 2009, Elifas conta que ainda criança, trabalhou na lavoura plantando café na pequena propriedade da família que depois foi entregue para o Banco do Brasil, por conta de dívidas. Em Londrina, “onde moramos por um período curto, minha mãe fazia empadinhas e salgadinhos para eu vender em um puteiro que ficava perto de casa. Aquilo eu achava uma maravilha. As prostitutas me protegiam e obrigavam os coronéis a comprar o tabuleiro todo para eu ir dormir mais cedo. E quando vejo uma prostituta, tenho um carinho especial”, afirmou.
Com a família, Elifas chegou a São Paulo em 1960, em busca de um tratamento para curar o alcoolismo do pai. A família foi morar em um cortiço “muito ruim, na Vila Anastácio”, conta ele. Conseguiu, com ajuda de um vizinho, um emprego de aprendiz de torneiro mecânico na fábrica da Fiat Luz. Foi o primeiro trabalho com carteira assinada. E foi na fábrica da Fiat Lux, conta Elifas, “que fui alfabetizado e descobri que tinha habilidade para fazer esculturas. Na Fiat Lux eu era encarregado de fazer a decoração do salão de bailes. Um dia, a jornalista Marli Medalha, foi à fábrica e conheceu meus desenhos e virei menino-prodígio da noite para o dia. Eu tinha 15 anos”.
Trabalhou em um pequeno estúdio onde fazia desenhos com nanquim sobre papel com gesso. “Levado por um amigo, o Zé Cantor, fui apresentado ao cantor e compositor Luiz Vieira, que era um astro da TV Record. Fui trabalhar em cenografia. Trabalhei e não recebi. Minha vida mudou quando um diretor da Editora Abril, Atílio Basquera, viu um outdoor colorido que fiz. Entrei na Abril em 1967 como estagiário e trabalhei nas redações das revistas Claudia, Manequim, Quatro Rodas, Placar e Realidade, com um timaço de jornalistas”, lembra.
Mesmo com a censura, Elifas dividia seu tempo entre a Abril e um jornal. “Comecei a colaborar clandestinamente com o Jornal Libertação, com Carlos Azevedo e Iolanda Huzak. A redação era no meu apartamento”.
O salário da Editora Abril “era bom e permitiu que eu melhorasse de vida e entre outros bens, adquiri um sobrado para a minha mãe na Água Branca”. Em 1972 se associou aos jornalistas Raimundo Pereira e o Fernando Gasparian e fundaram o Jornal Opinião, que combatia o regime militar. Essa militância política sempre foi uma característica forte do artista. Fez vários cartazes para movimentos populares e sindicais. Ele é o criador do troféu “Vladimir Herzog”, prêmio que o Sindicato dos Jornalistas de São Paulo entrega anualmente para pessoas que se destacam no campo dos direitos humanos.
Elifas tem dois filhos, Bento que é designer e a Laura. “Minhas alegrias, dois seres humanos incríveis, do bem”, como se refere a eles.
O estúdio de comunicação Empório Elifas Andreato foi criado em 1988 em Perdizes bairro onde ele morou por muitos anos. No final do ano passado mudou-se para um condomínio em Ibiúna, a poucos quilômetros da capital. O filho Bento continua a morar em Perdizes.
A música brasileira é um campo onde o artista muito contribuiu e fez história. Foram várias capas de LPs e CDs feitos por Elifas. São capas memoráveis de artistas em coleções como Brasil Sentimental, cantores como Elis Regina, Paulinho da Viola, Adoniram Barbosa, Chico Buarque, Tom Zé e Criolo, um dos novos nomes da cena musical brasileira. “Os trabalhos do Elifas Andreato vai além da ilustração”, contou Toquinho no lançamento do livro. “O trabalho do Elifas nas capas e nos encartes, valoriza o artista além das canções”.
No teatro Elifas fez cartazes e também cenografia. “Em 1973, ao sair da Abril Cultural, havia lugar para quem criasse os cartazes para teatro e eu tinha propostas para ocupá-lo”.
Elifas fez capas de livros para autores como Roberto Drummond, João Antonio, Clarice Lispector, Elias José, Octávio Ribeiro, entre outros. Revistas como Veja Realidade, Playboy e outros impressos têm capas e ilustrações memoráveis feitas pelo artista paranaense.
O livro “Traços e Cores”, custa R$ 50 e é um passeio na história recente do país através dos trabalhos de Elifas que também é o criador do Almanaque Brasil, publicação que mostra a produção cultural do Brasil. Elifas, 50 anos depois, está em plena atividade e criando continuamente. (GA)