A volta por cima

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A escola de samba Águia de Ouro, apesar do esforço de seus componentes e da animação do desfile, acabou ficando em 13º lugar e foi rebaixada para o grupo de acesso, juntamente com a Camisa Verde e Branco, que ficou em 14º lugar. Entrevistamos Sidnei Carrioulo, presidente da Águia de Ouro, que promete para 2009 um carnaval de alto nível para voltar ao grupo especial. Ele aborda muitos temas, como a pouca participação do bairro junto à escola, que sempre tem a Pompéia em seus sambas-enredo. O problema que aconteceu com um carro alegórico pode ter sido a causa da queda da escola. Mas o carnaval é a vida da escola e com certeza a escola fará em 2009 um carnaval impecável, que a levará de volta ao grupo principal do carnaval de São Paulo.

Quantos integrantes a Águia de Ouro levou para avenida?
Este ano saímos com 3.600 integrantes. Foi o maior número de pessoas que colocamos no sambódromo.

Como foi o desfile da Águia?
Existe a visão popular, de quem vê pela televisão ou no sambódromo. E a do jurado, que vê a parte técnica do desfile. A gente se preocupa mais com o público do que com os jurados. Talvez esteja aí um erro nosso. O carnaval tem que despertar o interesse do público. Se todas as escolas desfilarem com o mesmo tema, só mudando o samba e a alegoria, fica uma coisa meio esquisita. Vira uma parada de semana da pátria. A escola é viva. Sempre temos uma novidade. Queremos agradar ao público. Os jurados fazem o julgamento técnico. E neste ano, aconteceu o problema que tivemos em um carro, que prejudicou parcialmente o nosso desfile. Foi aí que tivemos perda de pontos e ficamos na 13ª posição.

Vocês descobriram o que causou esse problema?
Não sabemos se houve alguma sabotagem. Prefiro não pensar e nem quero saber porque não vai resolver nada.

Quanto a Águia gastou para sair?
Chegou a um milhão de reais. Sempre em uma competição como o carnaval de São Paulo será pouco dinheiro. Cada um quer fazer melhor do que o outro. Ninguém diminui o padrão da sua escola. É claro que quanto mais dinheiro a escola tiver melhor será o carnaval que ela terá.

A diferença em pontos da Vai-Vai (campeã) e a Águia foi de três pontos. Isso prova que o carnaval de São Paulo está nivelado por cima?
A diferença é realmente pequena. Antigamente, tínhamos três ou quatro escolas que sempre brigavam pelo campeonato. Hoje, ninguém arrisca dizer quem será a campeã. Isso é bom e ninguém se acomoda. A proposta do carnaval tem de ser bem interessante, a execução precisa ser eficiente.

O tema “A Taça da Felicidade, uma viagem pelos sentidos às delícias do sorvete” funcionou?
Tínhamos uma promessa de um patrocínio que acabou não se concretizando. O público gostou, mas os jurados de enredo não gostaram. E foram duas escolas que saíram com sorvete no enredo. A forma didática que a outra escola apresentou foi melhor aceita pelos jurados. Os jurados não entenderam o nosso tema. Os sentidos, uma coisa natural. Uma das justificativas que um dos jurados deu é que “ele não entendeu o enredo da escola”. Alguma coisa está errada. Ou eu ou os jurados.

Qual foi o destaque que a Águia de Ouro levou para a avenida?
O nosso carro-chefe é a bateria que sempre sai na frente. Somos a única escola que faz isso. É uma marca nossa. Realmente é ousado. O recuo de bateria que fazemos é muito arriscado. A bateria se afasta do carro de som. Ensaiamos muito e sempre deu certo.

E agora que a Águia foi rebaixada, o que vocês planejam daqui para frente?
Existem duas respostas. Quando a escola sente que não foi bem, a gente sente a fraqueza da escola. E existe a outra que são os acidentes. O que aconteceu neste ano. A escola desfilou para disputar o título e de repente um acidente mudou a trajetória do nosso desfile. Mas isso faz com que a comunidade se fortaleça. Foi um acidente e todo mundo está sujeito a isso. Mexe com o brio da comunidade, com certeza.

Como a escola vai superar isso?
Com garra. Esse tombo vai fazer com que só fiquem na Águia de Ouro quem é Águia. Teve muita gente que estava aqui graças ao sucesso que a escola sempre fez. Nessa hora, fica quem veio e gostou e aquele componente que fica com a escola o ano todo. Não teremos em 2009 nenhum comprador de fantasia. Vamos sair apenas com os componentes. Você tem que curtir os ensaios, sentir a energia da escola. É preciso ter identidade com a escola.

E o envolvimento do bairro da Pompéia com a escola?
Tinha o pessoal que morava no alto, na Pompéia, e o pessoal que morava na parte baixa, na Vila Anglo, e redondezas, que era o pessoal mais carente. Foram essas pessoas que fizeram a Pompéia. Todo mundo conhecia os vizinhos. Foram elas que fizeram a Pompéia se transformar em um lugar agradável para morar. Depois, veio a especulação imobiliária e seus prédios maravilhosos. As pessoas que chegaram pouco se importam com o bairro. Quem morava de aluguel foi se mudando para a periferia, Carapicuíba, Cohab. Foram expulsas do bairro. No espaço que tinha quatro casas e quatro famílias foi erguido um prédio com cem famílias.

Os integrantes da escola que são da Pompéia chegam a quanto?
Cerca de 20% dos integrantes é do bairro, no máximo. Temos alas de Santo Amaro, de Interlagos, de Pirituba, do Bonfiglioli, do Mangalot. Além da escola de samba, a Pompéia não tem nada. Falta centro esportivo e cultural. A escola de samba é o único lugar de união. Se a escola sair daqui, o bairro vira um bairro-dormitório. Em nossos sambas sempre a Pompéia é citada. E eu pergunto: e a massa carente da Pompéia, como fica? Os bacanas passando de carro e o que sobra para a massa carente? Ficaremos sem história e teremos dois tipos de moradores: os que podem e os que não podem. A escola de samba é a maior democracia que existe. Todo mundo aqui é igual. Pouco importa a classe social. O bairro deveria abraçar mais a escola.

Como é o ano de uma escola de samba?
Temos duas escolas de samba em uma só. A que se prepara para um dia de desfile e a escola de samba que ensina as pessoas a gostar da cultura, preservar suas raízes. Apesar das dificuldades gostamos de carnaval. Vamos sempre ter samba de quadra, gente aprendendo a tocar instrumentos. O carnaval vai continuar sempre.

Qual é o trabalho social da Águia?
A escola de samba já é em si um trabalho social e atende às carências da comunidade. Temos aqui escolinha de instrumentos para crianças a partir dos sete anos. Temos escola de porta-bandeira e mestre-sala, de cavaquinho, futebol, trabalhamos com o pessoal da terceira idade. Fazemos aqui o que muita ONG que recebe dinheiro não faz. E sem patrocínio. E não temos o reconhecimento.

O poder público ajuda o suficiente as escolas de samba?
Entra e sai governo e a política não muda. Eles nos vêem como uma massa de eleitores. Quanto mais as escolas ficarem dependentes do governo, melhor para eles. Faltam verbas pública para o carnaval daqui, bem diferente do que acontece no Rio.

O que diferencia o nosso carnaval com do Rio?
São Paulo é um Estado emissor de turistas. O Rio é receptor: sai pouca gente e chega muita do Brasil e do exterior. Falta um projeto cultural para o carnaval daqui. Aqui quem faz, participa e assiste é a comunidade. Lá, quem faz é a comunidade e pouca comunidade e muito turista desfilam.

O que a Águia vai fazer para voltar para o grupo especial?
Uma reestruturação. Não vamos baixar o nível. O carnaval é nosso pavilhão.



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