“Casamento faz bem”

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Desde 2009, Dr. Douglas de Campos Cavazzi é Juiz de Paz do 19º Subdistrito de Perdizes, que engloba os bairros de Perdizes, Pompeia e Sumaré. Segundo suas contas, já oficializou mais de mil casamentos e outros 200 divórcios. É pós-graduado e especialista em direito notarial e registral pela EPD. É graduado em direito e em tecnologia de processamento de dados. Tem 15 anos de experiência em direito notarial e registral imobiliário, é professor dos cursos de pós-graduação em direito notarial e registral imobiliário da EPD e do IICS e coordenador da Comissão de Cidadania e Ação Social da OAB-Lapa. Nesta entrevista, ele fala de sua experiência em casamentos e divórcios e o que os casais devem estar atentos para que se o casamento não for eterno, não tenha fim de forma litigiosa.

Por definição, o que é um casamento?
É um contrato civil onde na verdade o que sustenta esse contrato é uma comunhão plena de vida. Tanto jurídica, comercial, mas principalmente afetiva.

O casamento ainda está em alta?
O casamento, além de ser uma tradição, é um sustento da sociedade. Nos casamentos que eu faço, sempre falo na hora da cerimônia para os casais e os presentes que o casamento organiza a sociedade e até previne crimes. A união estável foi a solução, vamos dizer não muito boa, que a Constituição de 1988 fez valer, o famoso “juntar”. O problema é que as pessoas que se juntam, na hora da separação, se houver guarda de filhos, ou na hora de um falecimento, que é mais comum, é preciso reunir provas de que aquela união era estável de fato. Com o casamento, isso não acontece. Evita que os fóruns fiquem entupidos de reconhecimentos de união estável. É comum as pessoas viverem juntas por vinte anos ou mais e não terem conta corrente em conjunto ou alguma coisa que prove essa união. Nestes casos, vai ser preciso arrumar testemunhas, de parentes, amigos, provas materiais de que essa união existia. É um transtorno danado. E tem o fator econômico. Hoje, um casamento custa 303 reais. E quem não tem renda pode alegar pobreza e consegue casar de graça. Casar custa bem menos do que se gasta na festa.

As pessoas estão casando mais?
A estatística mostra que o casamento está sempre à frente do divórcio. Ainda que o divórcio tenha aumentado em 2010 em 67%. Mas esses números não mostram a realidade. Atualmente, o divórcio ficou mais fácil e menos burocrático. Acredito que as pessoas que já estavam separadas, com as novas regras, resolveram regularizar a sua situação.

Que leis o senhor se refere?
Me refiro à Emenda Constitucional nº 66, de 2010. Basicamente, ela extinguiu prazos. Antes, você tinha que ficar pelo menos um ano casado para poder se separar judicialmente. Para conseguir o divórcio era preciso transcorrer um ano de separação. Esse tempo foi criado para que as pessoas pudessem refletir antes de concretizar o divórcio e pudessem pensar se era isso que elas queriam realmente. É bom citar que aí teve a interferência da Igreja Católica, que em 1977, para “aprovar/aceitar” a lei do divórcio, pediu que se desse esse prazo para que as pessoas pudessem se arrepender e continuar casadas. Fiz muitas reconstituições de casamentos. Eram pessoas que resolveram desistir do divórcio e voltar a ficar casados com seus antigos pares.

Isso é comum?
O que acontece é que as pessoas muitas vezes acabam se arrependendo da separação. Se separam, conhecem outras pessoas e acabam voltando ao antigo casamento.

É necessário ter um advogado para fazer o divórcio?
Para fazer o divórcio é necessário ter um advogado. Com o divórcio, as pessoas ficam livres para se casar novamente. Eu cheguei a oficializar casamentos de casais que haviam se divorciado e resolveram casar novamente.

Que providências ou cuidados os casais devem tomar antes do casamento?
O casamento, como disse, é um contrato bilateral entre duas pessoas. Defendo uma tese, que não é muito bem vista, que quando a gente casa, se deveria pensar mais no afeto, na afetividade. Mas a experiência nos mostra que não é bem assim na realidade. Que na hora que aparece algum problema, o patrimônio vira o centro da discussão.

Qual é o melhor regime?
O melhor regime é o de separação total. No caso de casados em regime de união parcial de bens, caso um dos cônjuges tenha um bem e queira vender, mesmo sendo anterior ao casamento, o outro precisa concordar, caso contrário o bem não pode ser vendido. O Código Civil obriga a anuência do outro, isso tem o nome de outorga uxória. Tudo que se vende, principalmente imóveis, precisa ter a anuência do outro. Mesmo que o outro não tenha nenhuma relação com esse bem. E em alguns casos isso geral litígio. E quando uma das partes não aceita é preciso entrar com um processo onde se pede ao juiz para assinar pelo cônjuge que não quer assinar. Já no regime de separação total, você dispõe de seus bens como e quando quiser.
 
Qual é o regime que a maioria dos casamentos prefere?
É o de regime de separação parcial de bens. Mas para aqueles que querem fazer o contrato de separação total de bens é preciso antes fazer um documento chamado pacto nupcial. Isso resulta em mais despesas, mas não é nada absurdo. Hoje custa 283 reais. Mas para quem está pensando lá na frente, vale a pena o investimento.

E os casamentos onde os cônjuges têm filhos de casamentos anteriores. Quais providências e cuidados os casais deveriam tomar?
Não tem uma fórmula ideal. O ideal seria sempre fazer pactos. Seja qual for o regime de bens – parcial ou universal. Antes de casar é ideal fazer doações dos bens aos filhos existentes antes dessa nova união. É uma forma de resguardar os direitos dos filhos. Por incrível que pareça, os filhos são meio-irmãos, mas criam problemas entre eles.

O que é o divórcio extrajudicial?
É o divórcio feito no cartório. Mas é preciso atender alguns requisitos: não pode existir filhos menores, tem que ter acordo entre os cônjuges. Se há filhos menores é preciso passar pelo fórum.

Quem decide pelo divórcio? Homem ou mulher?
Quando a mulher decide e quer se divorciar, ela é quem corre atrás de tudo e você só vê o marido na hora de assinar os papéis. O homem, acho eu, é mais medroso e sempre fica mais inseguro se o que está sendo feito é o que ele quer.

Na hora do divórcio vale tudo?
Sim. Cheguei a fazer um divórcio onde o casal discutia com quem ficaria o cão labrador. Acabou ficando com o marido. Foi conturbada a situação. Quando a discussão é sobre o material ainda é contornável. Agora, quando envolve os filhos menores a coisa fica complicada. Tem uma lei para tratar isso: alienação parental.

Segundo o IBGE, os homens se divorciam aos 43 anos e as mulheres aos 40 anos. Isso se comprova na sua experiência?
O que se percebe é que o divórcio hoje em dia acontece com casais bem mais jovens que esses números do IBGE.

Tem uma explicação?
Na realidade, o casamento é um contrato de amor. E as pessoas ficam com menos liberdade. Eu criei a expressão “o casamento é o tempo todo uma cedência recíproca”. Os dois precisam ceder e sempre. A partir do momento que um dos dois não cede, e um bate de frente com o outro, aos poucos isso vai crescendo até que um não aguenta mais. O que eu percebo, infelizmente, que o maior motivo para divórcios é a traição. E quem trai mais é o homem.

E a união de pessoas do mesmo sexo?
Ainda não acontece aqui na cidade de São Paulo. A religião ainda exerce uma grande pressão. O STF (Superior Tribunal Federal) autorizou e compara a união estável do mesmo sexo com a de sexos diferentes. A lei permite que a união estável seja convertida em casamento. O primeiro casamento aconteceu em Jacareí (SP), com um casal de homens. Na cidade de São Paulo, não aconteceu por conta da Corregedoria de Justiça. Eles vão acabar regulamentar isso. Até então, por minhas limitações, ainda não posso fazer isso.

Por que o senhor optou pelo direito de família?
Me envolvo muito com os sentimentos das pessoas e muitas vezes quero ajudar. A área de família é onde essa relação é mais intensa. A vida me levou a querer lidar com as pessoas. O direito de família é uma sessão psicológica o tempo todo. Sou um conciliador.

Nossas leis com relação ao tema estão adequadas?
Acho que de cinco anos para cá tem acontecido uma melhora com a informatização do judiciário. O Fórum da Freguesia do Ó é informatizado mas é mais lento do que o da Lapa, que não é informatizado. Faltam funcionários. Em relação às leis, estamos nos modernizando.

Fazer casamento é bom?
O casamento sempre dá prazer de fazer, infinitamente. Casar é bom. Para mim, casar se resume em dois pontos: uma união plena de vida e a tal da cedência recíproca. Problemas vão existir sempre, no casamento, no trabalho, na vida. Mas se essa comunhão plena de vida pensar que abrir mão de alguma coisa em prol do seu companheiro, em prol do seu amor, consegue levar pelo resto da vida. Lógico que se engole sapo, tanto um como o outro. Talvez o maior problema seja a interferência dos parentes de fora. A intromissão da sogra, do cunhado, com certeza, os cônjuges precisam estar preparados para aceitar isso. É preciso que as outras pessoas respeitem o casal. Todo mundo que se intromete no casamento sabe que não é bom.

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